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Anistia aos presos do 8 de janeiro: Entre a conciliação e a impunidade

Um risco imperdoável à memória e à democracia, em especial à luz da história recentе, com temática tratada no filme “Ainda estou aqui”. O que temos a aprender com a recente vitória do cinema brasileiro?

Artigo de autoria dos advogados Ramon Bourguignon Gava e Victor Massante Dias, em colaboração com o Jornal Espírito Santo Notícias

A recente proposta de anistia aos presos pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, em Brasília, coloca em xeque o delicado equilíbrio entre dois valores fundamentais: a conciliação social e a justiça. Como advogados, compreendemos a complexidade do tema, mas posicionamo-nos firmemente contra a anistia nesse caso. A gravidade dos atos exige uma resposta clara: a conciliação não pode se sobrepor à responsabilização, sob pena de enfraquecermos os alicerces da nossa democracia, já tão duramente conquistada.

A anistia, enquanto instituto jurídico, tem por objetivo o esquecimento legal de determinados delitos, promovendo a pacificação social após períodos de grande convulsão política. No entanto, a sua aplicação exige cautela e responsabilidade, sob pena de gerar um perigoso clima de impunidade. No caso em questão, é preciso ter em mente a gravidade dos atos de 8 de janeiro. A invasão e depredação das sedes dos Três Poderes da República representaram um ataque frontal à democracia e ao Estado Democrático de Direito, colocando em risco a ordem constitucional. Testemunhamos cenas estarrecedoras de vandalismo e violência que jamais serão apagadas da memória nacional.

A memória, aliás, nos serve como um guia. A recente vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro de 2025 pelo filme “Ainda estou aqui”, que retrata os horrores da ditadura militar brasileira, nos recorda das dolorosas consequências da impunidade. Anistiar os crimes da ditadura não impediu que as feridas do ado continuassem abertas, e a sombra da violência política continuou a pairar sobre o Brasil. Da mesma forma, esquecer o 8 de janeiro, e pior, perdoá-lo sem o devido processo legal, equivaleria a naturalizar a violência política e abrir um perigoso precedente para o futuro. Que mensagem estaríamos ando às futuras gerações? Que agredir a democracia e as instituições é um caminho aceitável?

A responsabilização individualizada, com a devida identificação dos mentores e líderes desses eventos, é fundamental para que a justiça prevaleça e para que a impunidade não sirva de incentivo à repetição de atos antidemocráticos. Assim como o reconhecimento dos crimes da ditadura, a punição aos responsáveis pelo 8 de janeiro é fundamental para que possamos romper com o ciclo de violência política e impunidade no Brasil. Precisamos aprender com o ado para não repetirmos os mesmos erros. Esquecer, relativizar ou minimizar o 8 de janeiro é impedir que a história cumpra seu papel de farol, guiando-nos na construção de um futuro onde a democracia seja inegociável.

A anistia, quando utilizada de forma indiscriminada e sem o devido cuidado, corre o risco de se transformar em instrumento de perpetuação da injustiça e da impunidade. O Brasil precisa, antes de tudo, fortalecer suas instituições democráticas e garantir que atos como os de 8 de janeiro jamais se repitam. E isso começa com a responsabilização, com a justiça e com a preservação da memória, por mais dolorida que ela seja. Afinal, como nos ensina o filme “Ainda estou aqui”, a história tem a desagradável mania de se repetir quando não aprendemos com seus erros.

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